terça-feira, agosto 27, 2002

MEU ANTONIO

*** amo amo amo um oito deitado, infinitamente
essas palavras, fico lendo lendo lendo encantada com
a rosinha e com os homens ruins que comem cebola crua.

Crônica "Oração", Antonio Maria escrita em 30.03.1954:

"Rosinha Desossée, me tire desse quarto de hotel
e de todas as coisas que entram pela janela; me
leve para longe das palmeiras, mais longe e perto
das coisas mais macias; me faça esquecer (depressa)
os homens ruins -- isto é: os que gostam de cebola crua;
me ensine, Rosinha Desossée, tudo o que eu não aprendi:
a cortar com a mão direita, a usar anel, a tocar piano,
a desenhar uma árvore e valsar; e me lembre do que
eu esqueci -- raiz quadrada, (as mais ordinárias),
frações, latim, geofísica e "Navio Negreiro", de Castro Alves;
depois, me dê, pelo bem dos seus filhinhos, aquilo que eu
não tenho há quase um ano, carinho -- de um jeito que eu
não sei dizer como é, mas que há, por aí ou, pelo menos,
já houve; destelhe a casa, deixe a noite entrar e, juntos,
vamos nos resfriar; espirre de lá, que eu espirro de cá...
agora, cada um com a sua bombinha, inalação, inalação;
lado a lado, sentemos, os dois de perfil para o ventilador;
minhas mãos e as suas não são de ninguém, entendido?;
se interesse por mim e pergunte o que eu sei, que eu
quero exclamar, no mais puro francês: "oh!"...
"comment allez vous"? (...) de um jeito ou de outro,
me tire daqui, pra Pérsia, Sibéria, pro Clube da Chave,
pra Marte, Inglaterra, sem couvert, sem couvert;
está vendo o retrato dos meus 20 anos? de lá para cá,
cansaço, pé chato, gordura, calvície fizeram de mim
essa coisa ansiosa, insegura e com sono, que pede a
você, no auge do manso: você, Desossée, não saia
esta noite e fique, ao meu lado, esperando que o
sono me tome e me mate, me salve e me leve,
por amor ao teu andar, assim seja..."

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