quarta-feira, novembro 07, 2001

I LOVE DICIONÁRIO TOO

0 LIVRO DA SOLIDÃO
[Cecília Meireles]

Os senhores todos conhecem a pergunta famosa universalmente
repetida: "Que livro escolheria para levar consigo, se tivesse de
partir para uma ilha deserta...?"

Vêm os que acreditam em exemplos célebres e dizem
naturalmente: "Uma história de Napoleão." Mas uma ilha
deserta nem sempre é um exílio... Pode ser um passatempo...

Os que nunca tiveram tempo para fazer leituras grandes, pensam
em obras de muitos volumes. É certo que numa ilha deserta é
preciso encher o tempo... E lembram-se das Vidas de Plutarco,
dos Ensaios de Montaigne, ou, se são mais cientistas que filósofos,
da obra completa de Pasteur. Se são uma boa mescla de vida e sonho,
pensam em toda a produção de Goethe, de Dostoievski, de Ibsen.
Ou na Bíblia. Ou nas Mil e uma noites.

Pois eu creio que todos esses livros, embora esplêndidos, acabariam
fatigando; e, se Deus me concedesse a mercê de morar numa ilha deserta
(deserta, mas com relativo conforto, está claro — poltronas, chá, luz elétrica,
ar condicionado) o que levava comigo era um Dicionário. Dicionário de
qualquer língua, até com algumas folhas soltas; mas um Dicionário.

Não sei se muita gente haverá reparado nisso — mas o Dicionário é um
dos livros mais poéticos, se não mesmo o mais poético dos livros.
O Dicionário tem dentro de si o Universo completo...

Nenhum comentário: